Textos de Alberto Moreira Ferreira
Escreveste muito para combateres o tédio dos dias desocupado devido à sorte desgraçada que te bateu à porta numa altura em que não a esperavas, que nada faria prever. Escreveste muito para preencheres a alma que parecia desaparecer ou esvaziar-se na ociosidade do tempo mestre carrasco dos barcos, que definham e murcham. Trabalhaste tanto para libertar, para acordares nas lembranças a sangrar. Sangraste para aprenderes conheceres e purificares. Atravessaste travessas para seres outro novo dia e um dia teres sido. E escreveste muito a sonhar, impedindo a entrega total das mãos à porta dos sem esperança. Partiste pedra para não te renderes à inconsciência dos do coro amontoados por aí, onde a humanidade se esconde como Molière às três pancadas na caixa do correio avec un coeur brisé, à rigidez dos martelos pneumáticos, ao gelo quente dos dias vazios onde os copos se digladiam em histeria numa campanha de marketing sem mais um dia, e hoje que a noite ainda não tem abrigo, não faz sentido escreveres e deixares o teu amor sozinho.

"Uma Casa Verde"